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Caio Julio Cesar, o primeiro dictador perpetuo de Roma, ou melhor o primeiro imperador romano, depois que esta palavra começou á designar o soberano, foi grande nas armas, grande nas lettras, grande na sciencia de dirigir homens em geral, reunindo n’um e o mesmo sujeito tres qualidades eminentes em qualquer época da civilisação humana, das quaes uma só basta para formar o grande homem, e cercal-o de bem merecida celebridade no seu seculo e no porvir.

Como capitão só tem ignaes, através de tantos seculos como os que se contão da civilisação grega e romana até nós, em Alexandre Magno de Macedonia, e Napoleão Primeiro de França, sendo mui superior a Pompêo que lhe disputou o imperio e a celebridade, e a nenhum dos tres pode ser equiparado em talentos militares, posto tivesse no seu tempo o nome de grande.

Como homem de lettras foi um dos litteratos mais abalisados de Roma no tempo que mais nella florecêrão as lettras latinas,[1] rival de Cicero na oratoria, e, no genero de historia a que se dedicou, um dos primeiros, pois ainda ninguem que se propuzesse historiar os proprios feitos, o excedeo no decurso de tantos seculos. Pelo contrario, Xenophonte que lhe servio de modelo na sua famosa «Retirada dos Dez Mil», foi, com ser historiador de grande merito, por elle igualado, se não excedido.

Como politico e estadista poucos se lhe assemelhão. Não pretendemos certamente estabelecer comparações, que nem a diversidade dos tempos, nem a das circumstancias comportão; mas é sabido que o imperio de Alexandre Magno se desmoronou por sua morte, assim como o de Napoleão Primeiro com sua queda, e o de Cesar permaneceo muitos seculos intacto. Do primeiro, dividido e retalhado entre os generaes de Alexandre, apenas restou o dominio dos Gregos na Asia e no Egypto até as conquistas dos Romanos: do segundo, inteiramente dissolvido, apenas o influxo latente em França e na Italia, o qual obrando surdamente até predominar, produzio o Imperio Francez do imperador Napoleão

  1. O chamado Seculo de Augusto não foi senão a continuação de grande impulso dado ao estudo das lettras no tempo de Cicero, Cesar, e Hortencio. Virgilio, Heracio, e Tito Livio, viverão com Cesare Cicero,