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CONTOS E PHANTASIAS

Para elle com certeza que a adolescencia não tivera as suas madrugadas azues tão gorgeadas e tão festivas, nem a virilidade tivera a fanfarra estridente dos seus clarins, a florescencia escarlate dos seus rosaes voluptuosos.

Tinha sempre vivido debaixo de uma estranha pressão dolorosa.

Dependêra de todos primeiro porque era fraco e inerme, depois porque fôra pobre, dependente, sem aquella aspera dignidade que os atrictos da vida tornam mais rude e que é a armadura moral que salvaguarda o homem nos duros combates sociaes.

Nasceu n’uma casa opulenta que lhe não pertencia, cresceu no meio de um luxo de que seus paes erão parasitas voluntarios e de que elle era... parasita inconsciente.

Começára por ter medo de tudo e de todos; um medo que não raciocinava, que não sabia, que não indagava mesmo a sua propria origem.

Nasceu assustadiço, como certos animaes silvestres, e toda a vida conservou a mesma expressão inquieta e medrosa da lebre perseguida.

Em primeiro lugar tinha medo de seu pae; um homem alto, espadaúdo, plethorico, de voz grossa e modos brutaes, que comia como um abbade, que bebia como um lansquenete, que praguejava como