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Página:Contos para a infancia.djvu/83

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CONTOS PARA A INFANCIA

boas obras, e quanto a orações não as sei, pobre de mim que sou um peccador. O que faço é andar de casa em casa a divertir os outros.»

O austero ermitão continuou a insistir:

— Estou certo que, no meio da tua existencia vagabunda, praticaste algum acto de virtude.»

— Em verdade não poderia citar nem um só.»

— Mas então como chegaste a este estado de pobreza? Tens vivido loucamente como os que exercem a tua profissão? Dissipaste frivolamente o teu patrimonio e o producto do teu officio?»

— Não; mas um dia encontrei uma pobre mulher abandonada, cujo marido e filhos tinham sido condemnados á escravidão para pagar uma divida. Essa mulher era nova e bella, e queriam seduzil-a. Recolhi-a em minha casa, protegia-a em todos os perigos, dei-lhe tudo que possuia para resgatar a sua familia, e levei-a á cidade, onde ella devia encontrar-se com seu marido e com seus filhos. Mas quem não teria feito outro tanto?»

A estas palavras o ermitão poz-se a chorar, e exclamou:

— Nos meus setenta annos de solidão nunca pratiquei uma obra tão meritoria, e apezar disso chamo-me o homem de Deus, emquanto que tu não passas d'um pobre musico.»