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o contraponto da escalada de poder do Estado com a aceleração da computação. De fato, para os estudos de vigilância dos finais da década de 80, a centralização do computador enquanto ferramenta de administração pública completaria o projeto panóptico de Jeremy Bentham de duas maneiras: expondo o comportamento do público e tornando opacos os aparatos de vigilância.[1]

No ínterim do aprofundamento das preocupações sobre a erosão da privacidade, os manifestos de May e Eric Hughes foram sintomáticos, respectivamente, do presságio e da reação às “criptoguerras” (como viriam a ficar conhecidas as disputas em torno da criptografia notadamente na década de 90, mas com diversas renovações contemporâneas): em 1988, ano da primeira aparição do Manifesto Criptoanarquista[2], já era densa a proximidade dos riscos aos direitos refletidos em regulações restritivas à criptografia; em 1993, o “Manifesto Cypherpunk” já mobilizava um repertório de reação a políticas públicas e teorizava, ainda que implicitamente, sobre o direito à privacidade e à proteção de dados[3]. Coincidentemente, no mesmo ano era publicado no Brasil o ensaio “Sigilo dos dados: o direito à privacidade e os limites da função fiscalizadora do Estado”, de Tércio Sampaio Ferraz Júnior, um marco teórico na sedimentação do direito ao sigilo das comunicações no país.

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  1. IYON, David. 9/11, Synopticon, and Scopophilia: Watched and Being Watched. University of Toronto Press, 2005. p.44.
  2. Conta-se que Tim May distribuíra fotocópias com os primeiros rascunhos do Manifesto em uma conferência sobre criptografia em Santa Barbara, em 1988, onde praticamente ninguém lhe dava atenção. Não se davam conta de que recebiam escritos que ficariam para a história. Ver Andy Greenberg. Op cit. p. 72-74.
  3. FERRAZ JR. Tércio Sampaio. Sigilo de dados: o direito à privacidade e os limites à função fiscalizadora do Estado. Revista da Faculdade de Direito, USP, Vol. 88. p. 447-448. Disponível em https://revistas.usp.br/rfdusp/article/view/67231.