Estou vendo, daqui, surpresa nos teus olhos verde-claros, nêsses olhos que investigam furiosamente a vida alheia, inventariando-a sem piedade. Adivinho que pensas, nêste instante: — «E' que eu nasci para viver em cenários de alto luxo, para envergar vestidos preciosos, para me cobrir de joias resplendentes, para levar uma vida de princesa milionária; nada disso possuo; e não me resigno a saber que outras, que não valem mais do que eu, têm tudo ou parte disso...» Pensas assim, não é verdade, Lúcia?
Mas quási todas nós nascemos — ou julgamos ter nascido ― para a grandeza e para a beleza. E como somos geralmente impotentes para alcançar a grandeza e a beleza pelo seu lado material, resta-nos um recurso, filão maravilhoso de alegrias sãs e legítimo orgulho. Esse recurso consiste em sentir e praticar coisas belas e elevadas, cultivando em nós mesmas a ternura, a generosidade, a indulgência, o amor pelos que sofrem. Isto é belo, é grande; e é, também, útil e fecundo.
Experimenta. Procura aplicar à tua alma envenenada o antídoto salvador que te aconselho. Eu sei que se melhante propósito é difícil de realisar por quem, como tu, se preocupa mais com a vida exterior do que com a vida íntima. Não posso deixar de sorrir ao supor-te torturada pela recordação do Rolls-Royce de
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