Saltar para o conteúdo

Página:Diana de Liz - Memorias duma mulher da epoca.pdf/76

Wikisource, a biblioteca livre
Diana de Liz: Memorias


Segunda-feira, 31.

A nuvem de que Gilberto me falou há algum tempo, paira, na verdade, entre mim e ele. Sinto-a, vejo-a oscilar, cinzenta e turva, envenenando o prazer e arrefecendo a alegria. Por vezes, parece atenuar-se, adelgaçando-se, evaporando-se; é quando no cerebro de Gilberto ou no meu surge a reflexão de que nenhum dos dois suspeitava, ao conhecermo-nos, do lugar escolhido que Luciano ocupava e ocupa no coração do outro. Se não houve intenção malevolente, como póde existir a culpa de que nos acusamos?!

Mas, apesar deste pensamento breve, ilusóriamente consolador, que de quando em quando vem suavisar a perturbação dos nossos espiritos, a lembrança de Luciano pesa sobre nós, amortece-nos o entusiasmo e amargura os nossos beijos, inevitavel e irremediavelmente...

Tenho, mais do que nunca, o pressentimento de que sofrerei dentro em pouco o abalo moral dum rompimento com Gilberto, porque adivinho que a sua amizade por Luciano mo arrebatará. Gilberto já está convencido de que eu sou, na realidade, sómente uma dedicada amiga de Luciano e esse facto é um tanto animador; não compreendo, contudo, o estranho prazer que ele parece sentir em pronunciar a cada ins-

— 74 —