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CAPITULO III
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de opinião, manifestando-se primeiro em favor do mais velho dos dous principes e em seguida em favor do mais novo.

A Austria, tão certa quanto a Inglaterra da impossibilidade de qualquer tentativa por parte de Dom Pedro de reunir as corôas de Portugal e Brazil ou de delegar uma d'estas duas soberanias, pretendia de accordo com a sua politica proverbial, arranjar as cousas por meio de um casamento. O consorcio de Dona Maria da Gloria com seu tio Dom Miguel fôra primeiro lembrado no Rio de Janeiro e em Lisboa, mas Metternich, que conhecia bem os seus semelhantes, percebeu, talvez melhor do que ninguem, que seria esse o meio de estabelecer suavemente a realeza do infante.

O mesmo espirito arguto que soube medir a basofia de adventicio de Napoleão e converteu o senhor do mundo no servo de uma archiduqueza, previa que n'aquelle matrimonio na Casa de Bragança, o esposo seria o amo. A personalidade do infante tinha-se-lhe tornado familiar. Seu caracter, mais fogoso do que auctoritario, difficilmente admittiria no regimen conjugal uma partilha do poder soberano. Dona Maria tambem manifestaria no futuro — tinha então apenas 7 annos — ser rainha orgulhosa e voluntaria, como o era o pai na sua exhuberancia masculina, mas havia tambem na sua natureza traços essencialmente femininos, entre elles o da condescendencia para com o esposo a quem fosse devedora das suas successivas maternidades. Não raro a Rainha se havia de eclipsar na penumbra da mãi amantissima[1].

O infante permanecia em Vienna e a Hespanha começou a insinuar-lhe que regressasse para Portugal e encabeçasse uma situação que de direito lhe pertencia e tambem de facto no dia em que quizesse, tal era o enthusiasmo que por elle sentia a grande maioria do paiz. Não havia o finado Rei dado a seu filho primogenito e dilecto o conselho de apoderar-se da corôa do Brazil se, como sagazmente o conjecturava, occorresse o rompimento imminente e o vasto dominio americano ficasse á

2Oliveira Lima — Dom Pedro e Dom Miguel.
  1. Foi o que occorreu quando desposon em segundas nupcias Fernando de Saxe Coburgo Gotha, primo do principe consorte Alberto e do duque reinante Ernesto, o qual nas suas reminiscencias se occupa do casal e relata n'uma carta ao irmão, escripta de Lisboa, que « a Rainha, dando boa mostra da sua prudencia, confiara a Rei a tarefa de governar, que elle desempenhava com muito zelo e circumspecção». Na pagina seguinte ajunta: « A Rainha a ninguem recebe só; todos se entendem com Fernando que os escuta e decide seus negocios, levando-os depois a beijarem a mão da Rainha ». (Memoirs of Ernest II, Duke of Sure-Coburg-Gotha, Londres 1886, vol. I).
    O primeiro marido de Dona Maria II foi o duque Augusto de Leuchtenberg, filho do principe Eugenio de Beauharnais e irmão da segunda mulher de Dom Pedro, a imperatriz Amelia. Foram apenas casados dous mezes e por occasião do seu fallecimento, aos 25 annos, tambem se fallou de envenenamento.