Página:Encadernado da Harvard University sobre a Questão Coimbrã.djvu/151

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se torna a lêr, em que se voltam de mil maneiras as formas arredondadas, em que não ha um pensamento, e em que prima o sr. Castilho. E esta sua prosa é muito portugueza na dicção; portugueza de dois seculos atraz, quinhentista pela fórma intertelada e urbana, seiscentista pelo requinte, e sobre tudo dissonante para quem conhece a verdadeira eurythmia da lingua, pela mistura insólita e desnatural da gravidade academica com as locuções desenfadadas e legitimas do nosso povo.

Ainda ha por ahi quem pensa que uma lingua não progride com as necessidades intellectuaes ou materiaes de um povo. Não admira, porque entre nós as necessidades intellectuaes são nullas, e o sr. Castilho é o primeiro a reconhecel-o, quando se enfaixa nos Sousas e Lucenas e decreta urbi et orbi as gallanices do estylo. Nos Quadros Historicos, obra tão falada e gostada, abundam paginas infindas, safaras de idéas, seccantes pelas extorsões dos elementos da oração, mas portuguezas de lei. Citámos um livro, justamente aquelle em que o sr. Castilho levantou um protesto contra a eschola romantica de Victor Hugo; n'aquelle prologo diz heresias inauditas contra o ideal; mas sua excellencia veio como os falsos prophetas, queria excommungar, e as palavras do esconjuro converteram-se-lhe em bençãos. De tudo o que o auctor da Ode arcadica a D. João VI tem escripto até ás traducções paraphrasticas de Ovidio, se alguma cousa ha que se lêa, é imitação da escola romantica: tal é o drama Camões. As obras do sr. Castilho tem o valor economico da raridade. É o que faz com que se fale nos Quadros Historicos, porque poucos os tem visto; lidos, e conhecida a intenção do auctor, occupam um logar somenos ainda abaixo do que é mediocre. O sr. Alexandre Herculano emprehendeu a Historia de Portugal com este espirito severo da escola analysta de Guizot e Macauley; tinha de sacrificar, de nos expropriar,