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ESPUMAS FLUCTUANTES

Dos passaros, das féras e doa homens,
Até que a fome os extinguisse, ou fossem
Os dentes frouxos saciar algures!
Elle mesmo alimento não buscava...
Mas, gemendo n'um uivo longo e triste.
Morreu lambendo a mão, que inanimada
Já não podia lhe pagar o affecto.

Faminta a multidão morrêra aos poucos.
Escaparam dous homens tão sómente
De uma grande cidade. E se odiavam.
Foi junto dos tições quasi apagados
De um altar, sobre o qual se amontoaram
Sacros objectos p'ra um profano uso,
Que encontraram-se os dous... e, as cinzas mornas
Reunindo nas mãos frias de espectros,
De seus sopros exhaustos ao bafejo
Uma chamma irrisoria produziram!...
Ao clarão que tremia sobre as cinzas
Olharam-se e morreram dando um grito.
Mesmo da propria hediondez morreram,
Desconhecendo aquelle em cuja fronte
Traçara a fome o nome de Duende!

O mundo fez-se um vácuo. A terça esplendida,
Populosa tornou-se n'uma massa
Sem estações, sem arvores, sem herva,
Sem verdura, sem homens e sem vida,
Cahos de morte, inanimada argila!