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Cuspo, cujas caudaes meus beiços regam,
Sob a fórma de minimas camándulas,
Bemditas sejam todas essas glándulas,
Que, quotidianamente, te segrégam!

Escarrar de um abysmo n’outro abysmo,
Mandando ao Céu o fumo de um cigarro,
Ha mais philosophia neste escarro
Do que em toda a moral do christianismo!

Porque, si no orbe oval que os meus pés tocam
Eu não deixasse o meu cuspo carrasco,
Jamais exprimiria o acerrimo asco
Que os canálhas do mundo me provocam!

II

Foi no horror dessa noute tão funerea
Que eu descobri, maior talvez que Vinci,
Com a força visualistica do lynce,
A falta de unidade na materia!

Os esqueletos desarticulados,
Livres do acre fedôr das carnes mortas,
Rodopiavam, com as brancas tibias tortas,
N’uma dança de numeros quebrados!

Todas as divindades malfazejas,
Siva e Ahriman, os duendes, o Yn e os trasgos,
Imitando o barulho dos engasgos,
Davam pancadas no adro das igrejas.