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mo, os assômos, a fadiga d´essa natureza que se lhe desdobrava aos pés qual incensorio immenso e trescalante... Sorria ao ver os jasmins embutidos de luar, queimarem-se de immoderações e cairem sobre o azulejo, á guisa de estrellas mortas, de illusões perdidas, de votos quebrados. Não invejava o arvoredo farto de calma e de frescor, furar mansamente o azul á semelhança de ilhas fluctuantes. Dava as costas ás rosas immoveis, rigidas, de apparencia vitrea, tal qual estivessem sob tampos de crystal, tal qual olhos parados de somnambulos erradios... Enviava a sua sympathia, a sua compaixão aos cravos que levavam a sua dôr ao auge, pedindo o orvalho, a aurora, o sol, a febricidade das asas de mica... O luar enfaixava-lhe a cabeça como um turbante, e, caindo em cheio sobre os crotons, avivava-lhes, ainda mais, as vestes sangrentas... Rumor surdo de vozes masculinas veio bater-lhe em o ouvido. Ladice abeirou-se da porta para melhor escutar. Ella viu Theophilo, João e mais dous outros approximarem-se e sempre falando, deterem-se á curta distancia do lugar onde se achava. Ao ouvir algumas palavras, a Senhora de Assis logo atinou com o assumpto da conversa. Referiam-se a um caso sensacional, que os jornaes do dia narravam com a crueza e exactidão de analysta indifferente e de arbitro — uma senhora de alta distincção que abandonara o lar.

Ladice se admirava da pouca deferencia com que tratavam, a sós, a mulher. Rasgando toda a cortezia, mostravam-se ferinos, maliciosos, golpeadores subtis, impiedosos para com as suas paixões. Mas ella tam-