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João queixava-se da solidão de sua vida de celibatario, da aridez invencivel de seu intimo, da saciedade suprêma de suas sensações...

— Tudo me enfastia, me aborrece... E´ uma loucura o homem se não casar — accrescentou elle.

Theophilo permaneceu calado, apenas deitou um olhar de piedade e de desprezo para esse libertino que o prazer esgotara, para esse homem que aos quarenta e oito annos, já sentia o grande silencio desolador, a inercia, a vacuidade de fremito, do fim da vida... Elle agora não podia revelar o ardor da juventude, mas devia ter as sombras, as duvidas, o encantamento do crepusculo, as penumbras, as claridades fuscas, o tom indeciso, ambiguo, que liga o dia á noite... A sua emotividade, a sua sensação findaram-se de repente como essas magnolias pequenas, como essas azáleas que tombam, que passam de subito da belleza ao nada, sem nunca emmurchecerem...

Restava-lhe sómente a carcassa do corpo, esse tecido biologico, esse envolucro vegetativo, essa parte physica de seu ser...

Achava-se de pé, em a vida como um animal — sem paixões. — Em mente Theophilo se lhe comparava: Apesar de tocar os limites da juventude, ainda trazia o abrasamento das primeiras surpresas, das primeiras investidas de amor, a incandescencia rubra das nuvens, dos espaços possuidos de sol... Elle se affirmava com orgulho de que, quando attingisse a idade de João, haveria de ter, a grandiosidade, o clarão mysterioso, soberbo em as suas vacillações, a