Página:Helena.djvu/304

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Entre a herança e o dever, dizia ela, escolho o que é honesto, justo e natural. Esta carta tirou-me o sono uma noite inteira, perplexo como fiquei entre o ato do finado e a resolução da herdeira. Que mão invisível tocara no coração do conselheiro essa corda de sensibilidade? Melhor fora que ele houvesse traduzido em uma simples lembrança a afeição que tinha a Helena. Longo tempo refleti nisso; o pai lutava com o pai. Tê-la comigo era a minha ventura, o meu sonho, a minha ambição; era a realidade que eu chegara a tocar com as mãos. Mas, podia atá-la ao carro decrépito da minha fortuna, dar-lhe o pão amargo de todos os dias? A família do conselheiro ia afiançar-lhe futuro, respeito, prestígio; a lei ia ampará-la. Perguntei a mim mesmo se, depois de haver morrido para o mundo, me era lícito ressuscitar para reclamar e reaver um título de que me havia despojado; finalmente, se possuía já o direito de fazer um escândalo. Estas reflexões, se viessem sós, teriam triunfado desde logo; mas em oposição a elas, vieram as sugestões do coração. Adverti que, cedendo à vontade do morto, cavaria um abismo entre mim e Helena, e que não mais, ou só raramente e a ocultas, podia desfrutar a felicidade de lhe dizer que a amava, de ouvir a mesma palavra de seu coração.