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MONTEIRO LOBATO

TIA NASTÁCIA — Sopa de batata, salada, salsa, galinha enso-
pada...

DONA BENTA — Que galinha matou?

TIA NASTÁCIA — Aquela franga sura de seis dedos no pé direito.

DONA BENTA(Recordando-se.) Essa franga parece
que era da Emília, não? Ouvi aí um negócio entre a Emília
e Narizinho a propósito dessa sura.

TIA NASTÁCIA — Eu sei, Sinhá. A franga era de Narizinho, mas
Narizinho vendeu o pé da franga para a Emília e me deu o
resto, de modos que matei a franga e guardei o pé de seis
dedos para a Emília, que anda agora com mania de fazer
um museu de coisas esquisitas. Tem cada uma . . .

Barulhada no terreiro vem interromper a conversa. É o bandinho que chega. Entram Narizinho, Pedrinho, Emília e o Visconde, atropelada-
mente.

NARIZINHO — Bom dia, ou boa tarde, vovó. (Corre a beijar a
mão da velha; Pedrinho faz o mesmo.)

DONA BENTA — Então? Por onde andaram?

NARIZINHO e PEDRINHO(Ao mesmo tempo em atropelo, um
dizendo uma frase e outro outra.) — Nem queira saber, vovó!
Tivemos uma aventura das mais perigosas. Na floresta
dos Tucanos Amarelos. Sim, lá perto da casa da menina
da Capinha Vermelha. Ela não estava em casa.

DONA BENTA(Levando as mãos aos ouvidos.) — Parem!
Vocês me deixam tonta, tonta. Cada um fale por sua vez.
Vamos, comece, Narizinho.

EMÍLIA(Que está a um canto mostrando qualquer coisa ao Vis-
conde.) — Não seja bobo! Eu sei o que faço. (E começa
a cochichar-lhe ao ouvido.)

NARIZINHO — Pois é isso, vovó. Fomos parar bem perto da casa
da Capinha Vermelha. Mas sabe quem encontramos? O
lobo! Aquele horrível lobo que comeu a avó dela! ...

TIA NASTÁCIA(Que já se ia retirando para a cozinha, entre-
para ao ouvir a palavra "lobo" e persigna-se, murmurando:
"Credo!")