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grande extensão do litoral e ainda do sertão brasileiro, em viagens de observação e estudo, nunca propriamente habitou o Brasil, quero dizer, nunca nele se demorou com ânimo de se domiciliar. O fato de sua origem germânica e formação portuguesa e européia, da sua constante ausência e pouca convivência do seu país natal e mais tarde de ter constituído família fora dele, dão a Varnhagen uma fisionomia particular, um todo nada exótico. Da estirpe germânica tirava seu instinto de veneração e respeito dos magnates, dos poderosos, das instituições consagradas e das cousas estabelecidas. É talvez o único brasileiro sem falha neste particular, justamente porque é em suma pouco brasileiro de temperamento, de índole e ainda de sentimento. Levou-o à pia batismal o próprio capitão general da província em que nasceu, o Conde de Palma. Desde aí é com tais próceres que anda. Como historiador, raro acha a censurar nos que têm o mando, ao contrário esforça-se por lhes encontrar sempre razões e desculpas. Do mesmo modo justifica sempre todas as instituições, descobre-lhes ou inventa-lhes virtudes e benefícios. Mal pode esconder o júbilo e a vaidade pela troca feita pelo imperador, seu amigo e protetor, do seu nome já glorioso de Varnhagen pelo de visconde de Porto Seguro. Consagrou toda a sua laboriosa existência a estudar a história do Brasil, e a servi-lo com dedicação e zelo em cargos e missões diplomáticas. Sente-se-lhe, entretanto, não sei que ausência de simpatia, no rigor etimológico da palavra, pelo país que melhor que ninguém estudou e conhecia, e era o do seu nascimento. Não é patriotismo, entenda-se, que lhe desconhecemos, esse o tinha ele, como qualquer outro e do melhor. Faltava-lhe, porém, não lho sentimos ao menos, aquele não sei que íntimo e ingênuo, mais instintivo que raciocinado, sentimento da terra e da gente. Ele não tem as idiossincrasias do país. Por isso Varnhagen não é de fato romântico, senão pela época literária em que viveu e colaborou; de todos os brasileiros seus contemporâneos no período inicial do Romantismo, é talvez o único que além de não ser