Página:Historias da meia noite.djvu/153

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— Se eu tivesse refletido nisso, observou ela, não faria nada do que fiz.

— Tem razão, ia dizendo Ernesto, mas levado de um mau espírito de vingança entendeu que a leviandade da moça devia ser punida com alguns minutos mais de dúvida e recriminação.

A moça ouviu ainda muitas coisas que lhe disse Ernesto, e a todas respondeu com um ar tão contrito e palavras tão repassadas de amargura, que o nosso namorado sentia quase rebentarem-lhe as lágrimas dos olhos. Os de Rosina estavam já mais tranqüilos, e a limpidez começava a tomar o lugar da sombra melancólica. A situação era quase a mesma de algumas semanas antes; faltava só consolidá-la com o tempo. Entretanto, disse Rosina:

— Não pense que lhe peço mais do que me cumpre. Meu procedimento alguma punição há de ter, e eu estou perfeitamente resignada. Pedi-lhe que viesse aqui a fim de me explicar o seu silêncio; pela minha parte expliquei-lhe o meu desvario. Não posso ambicionar mais...

— Não pode?...

— Não. Meu fim era não desmerecer a sua estima.

— E por que não o meu amor? perguntou Ernesto. Parece-lhe que o coração possa apagar de repente, e por simples esforço de vontade, a chama de que viveu longos dias?