chegou-se muito junto ao "turco" e indagou com um ar autoritário:
- Que é que você está dizendo?
O humilde armênio pensou logo que tratava com um soldado de polícia à paisana, pois lhe parecia que, na terra em que estava, todos os pretos são soldados e podem prender todos os armemos.
- Com essa convicção, Miguel José respondeu cheio de respeito e acatamento:
- Dizia, sinhor: cumpra santo muita bonita.
O negro perfilou-se todo, tomou uns ares judiciais ou policiais, chegou o chapéu de palha para a testa e disse:
- Você parece que não é civilizado.
- Cumo, sinhor?
- Sim, você é herege, inimigo de Nosso Senhor.
- Não, sinhor.
O preto desarmou-se um pouco de seus ares judiciais ou policiais, tomou-se mais suave, quis fazer de penetrante e sagaz. Perguntou:
- Você come came de porco?
E Miguel José olhou as montanhas pedregosas que ele via lá, longe, esbatidas no azul profundo da manhã, ressaltando quase inteiramente na ambiência translúcida do dia, e lembrou-se da sua aldeia armênia, das suas cabras, das suas ovelhas, dos seus porcos.
A sua fisionomia dura contraiu-se um pouco e os seus olhos de carneiro quiseram chorar de recordação, de sofrimento, de mágoa. Ele se encheu todo de uma pesada tristeza; mas pôde responder:
- Sim, senhor, eu coma.
- Então você é cristão? insistiu o preto.
- Sim, sinhor; diga a sinhor sou cristão.
- Admira.
- Por quê, sinhor?
- Porque você diz "vender" "comprar" santos.
- Cuma se diz então?
- Troca-se. Aprenda - está ouvindo! É falta