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HISTORIAS E SONHOS
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É ideal dos nossos dias que é ainda beleza a palpitar nas suas mais altas manifestações espirituais; e não, como o meu correspondente pensa, o ressurgimento de concepções desaparecidas, de que só conhecemos poucas e raras manifestações exteriores, que só podem entorpecer a marcha da nossa triste humanidade para uma exata e mais perfeita compreensão dela mesma.

Não desejamos mais uma literatura contemplativa, o que raramente ela foi; não é mais uma literatura plástica que queremos, a encontrar beleza em deuses para sempre mortos, manequins atualmente, pois a alma que os animava já se evolou com a morte dos que os adoravam.

Não é isso que os nossos dias pedem; mas uma literatura militante para maior glória da nossa espécie na terra e mesmo no Céu.

O meu correspondente acusa-me também de empregar processos de jornalismo nos meus romances, principalmente no primeiro.

Poderia responder-lhe que, em geral, os chamados processos do jornalismo vieram do romance; mas mesmo que, nos meus, se dê o contrário, não lhes vejo mal algum, desde que eles contribuam por menos que seja para comunicar o que observo; desde que possam concorrer para diminuir os motivos de desinteligência entre os homens que me cercam.

Se conseguirem isso, por pouco que seja, dou-me por satisfeito, pois todos os meios são bons quando o fim é alto; e já Brunetière me disse que o era, ao sonhar em esforçar-me, na medida das minhas forças, para fazer entrar no patrimônio comum do espírito dos meus contemporâneos, consolidando pela virtude da forma tudo o que interessa o uso da vida, a direção da conduta e o problema do nosso destino.

E, como ele queria, assim como querem todos os mestres, eu tento também executar esse ideal em uma língua inteligível a todos, para que todos possam chegar facilmente à compreensão daquilo a que cheguei através de tantas angústias. No mundo, não há certezas, nem mesmo em geometria; e, se alguma há, é aquela que está nos Evangelhos: amai-vos uns aos outros.

Para atingir tão alto escopo, tudo serve; e, como são Francisco Xavier, todos nós, que andamos em missão entre hindus, separados em castas hostis, entre malaios ferozes e pérfidos, entre japoneses que se guerreiam feudalmente; todos nós, dizia eu, só devemos ter a divisa do Santo: “Amplius! Amplius!”. Sim; sempre mais longe!

Rio, 31 — 8 — 16.