D. Leonarda, e, como tinha grande afeto ao sobrinho, sentia cócegas de lhe dizer alguma coisa, de o interrogar a respeito da mudança que lhe notava. Não se atrevia. A sra. D. Leonarda, com quem conferenciou a tal respeito, acudiu logo:
— Não lhe dizia eu? Não é nada; são amores. O rapaz está pelo beiço...
— Pelo beiço de quem? perguntou Bento Fagundes.
— Isso... não sei... ou... não posso dizer... Há de ser ali para os lados da Gamboa...
Bento Fagundes não pôde obter mais. Continuou aborrecido. Anacleto Monteiro não voltava a ser o que era antes; ele temia alguma pretensão mal acertada, e pensava já em intervir, se fosse caso disso e valesse a pena.
— Que tens tu, rapaz? Andas melancólico...
— Não tenho nada; ando constipado; dizia Anacleto Monteiro sem atrever-se a encarar o tio.
Metade dos motivos da constipação de Anacleto, já o leitor a conhece; a outra metade vou dizer-lha.
Insistira o rapaz no casamento, Carlota continuava a negacear. A razão deste proceder explica-se dizendo que ela queria fazer-se rogada, prender mais fortemente o coração de Anacleto, despeitá-lo; e a razão da razão era que mais de uma vez prometera a mão, desde o primeiro dia, a sujeitos que não se lembravam mais de ir buscá-la. Carlota namorava desde os quinze anos e estava cansada de esperar um noivo. Agora, seu plano era despeitar o pretendente, certa de que os homens nada desejam mais ardentemente do que o amor que se lhes nega desde logo. Carlota era um principezinho de Metternich.
Irritado com a recusa e o adiamento da moça, Anacleto cometeu um erro monumental: aventurou a idéia de que houvesse algum rival, e, negando-o ela, retorquiu o pascácio:
— Tenho, tenho... Não há muitos dias escapei de me perder por sua causa.
— Minha causa?
— É verdade. Um bigorrilhas, que, por minha desgraça, é meu primo, espreitou-me uma noite inteira e depois foi provocar-me.
— Sim?
— Provocar-me, é verdade. Estivemos a ponto de pegar-nos. Ele escumava de raiva, chorava, rasgava-se, mas eu que lhe sou superior em tudo, não lhe dei trela e saí.