Página:Lendas e Narrativas - Tomo I.djvu/183

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ferozes, o momento em que se realisa a summa ventura por largo tempo sonhada.

Do alto do throno e em pé, D. Fernando estendeu a mão: o tropel de cortezâos e cavalleiros, de donas e donzellas formaram aos lados da espaçosa sala fileiras esplendidas, immoveis e silenciosas: elrei volveu olhos lentos para um e outro lado, e disse:

“Ricos-homens, infançôes, e cavalleiros de Portugal, um dos mais nobres sacramentos que Deus neste mundo ordenou foi o matrimonio: como para os outros homens, para os reis se instituiu elle; porque por elle as corôas se perpetuam na linhagem real. É por isso que eu desposei hoje a mui illustre D. Leonor, filha de D. Affonso Tello, descendente dos antigos reis, e ligada com os mais nobres d’entre vós pelo divido do sangue. Assim a rainha de Portugal será mais um laço que vos una a mim como parentes, que de hoje ávante sois meus. Leaes como tendes sido a vosso rei pelo preito que lhe fizestes, muito mais o sereis por este novo titulo. Em que pez a traidores, D. Leonor Telles é minha mulher! Fidalgos portuguezes, beijae a mão á vossa rainha.” [1]

  1. Em grande parte extrahido quasi textualmente da Carta d’Arrhas de Leonor Telles, datada de Eixo aos 5 de Janeiro de era de 1410 (1372).