Página:Lendas e Narrativas - Tomo I.djvu/256

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E roubaram-me o filho da minha imaginação, dando-me uma tença!... Com uma tença paga-se a gloria e a immortalidade? Agradeço-vos, senhor rei, a mercê!... sois em verdade generoso ... mas o nome de mestre Ouguet enredar-se-ha no meu, ou talvez sumirá este no brilho de sua fama mentida...”

O cégo tremia de todos os membros: a vehemencia com que falára lhe exhaurira as forças: os joelhos vergaram-lhe, e assentou-se outra vez em cima do fuste. Os dous frades estavam em pé diante delle.

“Estaes mui perturbado pela paixão, mestre Affonso—­disse Fr. Lourenço depois de uma larga pausa—­por isso menoscabaes mestre Ouguet, que era talvez o unico homem que ahi havia capaz de vos substituir. Quanto a vós, pensaram os do conselho d’elrei que deviam propôr-lhe vos désse repouso e honrado sustentamento para os cansados dias. Ninguem teve em mente offender o mais sabedor e experto architecto de Portugal, cuja memoria será eterna, e nunca offuscada.”

“Obrigado—­atalhou o velho—­aos conselheiros d’elrei pelos bons desejos que em meu prol têm. São politicos, almas de lodo, que não comprehendem senão proveitos materiaes. Dão-me o repouso do corpo, e assassinam-me