Página:Lendas e Narrativas - Tomo I.djvu/270

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profundo mal se divisava sem se affirmar muito a vista. Mestre Ouguet ficára á porta, mas Fr. Lourenço tinha entrado.

“Reverendo prior—­disse elrei voltando-se para Fr. Lourenço—­vim tarde para gosar desta maravilhosa vista: vamos ao auto da adoração, e ámanhan voltaremos aqui a horas de sol.”

E seguiu para a banda da sacristia, cuja porta lhe foi abrir o prior.

Mestre Ouguet entrou na casa do capitulo, quando já os ultimos cavalleiros do sequito real íam saindo pelo lado opposto, caminho da igreja. Com as mãos mettidas no cincto de couro preto que trazia, e a passo mesurado, o architecto caminhou até o meio daquella desconforme quadra. O som dos passos dos cavalleiros tinha-se desvanecido; e mestre Ouguet dizia comsigo, olhando para a porta por onde elles haviam passado:

“Pobres ignorantes! que seria o vosso Portugal sem estrangeiros, senão um paiz sáfaro e inculto? Sois vós, homens brigosos, capazes dos primores das artes, ou sequer de entende-los?.. Lá vão, lá vão os frades celebrar um auto! Não serei eu que assista a elle; eu que vi os mysterios de Coventria e de Widkirk! Miseraveis selvagens, antes de tentardes representar