Página:Manuel da Maya e os engenheiros militares portugueses no Terremoto de 1755.pdf/5

Wikisource, a biblioteca livre

faz considerações scientificas de grande alcance; e a illustre escritora, dando noticia do seu conteudo, observa:

«Lendo este estudo de Kant acudiu-nos á memoria aquella carta, cheia de bom senso, que Gil Vicente mandou de Santarem a El-Rei D. João III «estando Sua Alteza em Palmella, sobre o tremor de terra que foi a 26 de janeiro de 1531». O philosopho allemão leva a vantagem ao poeta nacional[1] quanto a saber o ponto de vista critico; entre um e outro ha dois seculos de estudos scientificos; mas o nosso Gil Vicente não lhe fica atrás na inteireza do juizo e verdade do sentimento.

«É provavel que as numerosas relações contemporaneas sobre o terremoto, que Kant teve á vista, não fosse todas igualmente fieis; comtudo, o philosopho, armado com uma sciencia superior, positiva, e com um criterio elevado, soube distinguir claramente entre os casos impossiveis, inventados, e as verdades provaveis, tomando estas para base dos seus estudos. Teria o grande Marquês de Pombal, na epoca em que delineava o novo plano de Lisboa, noticia do seguinte importante conselho do illustre philosopho: que as arterias das grandes cidades ameaçadas não se devem construir paralelas às vias fluviaes (isto é, emquanto a Lisboa, do Occidente para o Oriente), porque o movimento do tremor segue essa direcção e prolonga-se pelo curso dos rios? (pag. 404). A sciencia já então tinha feito esta e outras descobertas».

A estas observações da illustre escritora acrescentaremos que, se realmente se obedeceu a esse principio scientifico, não se pode regatear ao grande Pombal a gloria de mais essa forma superior por que a sua

  1. Refere-se a Gœthe, que tambem se impressionou com o terremoto, contando então seis annos.