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Página:Marános, Teixeira de Pascoaes, 1920.djvu/122

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Logo a Saudade, ouvindo um som de passos
Que o silencio mais nitido tornava,
Correndo ao seu encontro, assim lhe disse:
—Ha quantas horas já que te esperava!—
E na face o beijou; e ao lado d'ele,
Dando-lhe a mão alvíssima e contente,
Alegre o acompanhava, conversando...


A Lua era já alta no Oriente.


E entrando na Capela abandonada,
Acenderam folhagens, urzes sêcas;
E o fumo azul e a chama alvoroçada
Irrompem, de mãos dadas, no ar bailando...
E sobre o altar, a Virgem parecia
Uma estatua animada ... e o fundo e triste
Silencio de abandono em que existia,
Era agora Marános e a Saudade...


Já um rumor longínquo de mudança
De tempo o céu turvava; e em torno á lua
Um desmaiado circulo de nevoa,
Em transparente palidez, fluctua...
E um vento repentino penetrou
Pelas frinchas da porta; e o fogo brando
Mysteriosamente se avivou
Ao contacto espectral d'aquele beijo...
E pela grande solidão noturna
E silencio da Serra, o vento alado
Sua voz oceânica em profundos
Murmurios derramava...

 E concentrado,