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II


MARÁNOS E A PASTORA




Já da serra fronteira a bela Aurora
Nascia toda luz; e já nas fontes
Os seus cabelos de oiro derramava
E nas encostas ingremes dos montes,
Quando a brisa pousando a sua mão
No rôsto de Marános, o acordou;
E sentiu novamente o coração
Bater ... e extasiado olhára o mundo!
Que divina alegria mysteriosa
Parecia descer na luz do sol
E inundar a Paisagem radiosa,
Cravejada de lumes e de côres.
E Marános sorria n'um desejo
De cantar, de voar! E no seu corpo
Um vago, esparso, indefinido beijo
Acendia-lhe o sangue alvoroçado.
E como as aves cantam, de manhã,
Alegre, ele cantava unicamente
Por se sentir viver!
 E n'um delirio
De pura exaltação e amor ardente
Que toca as proprias cousas insensíveis,
Voltado para o céu, que era uma flôr
Desprendida da Terra, assim dizia: