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Página:Marános, Teixeira de Pascoaes, 1920.djvu/38

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Que inundam de penumbra e de silencio
O espaço que medeia entre as estrelas!


«E que importa a distancia que sepára
Teus labios dos meus labios? E que importa
Que eu seja Luz eterna e sempre clara
E tu Sombra mortal e transitoria?
Que tu vivas n'um mundo e eu n'outro mundo,
Se nos prende e nos liga o fio astral
Que prende o olhar á estrela, e o mar profundo
Á sêde que o sol tem de nossas lagrimas?...


«Meu Creador e Amante, põe os olhos
N'esta tua divina Creatura
Que, insensível, eterea, te persegue...
Se teu vulto derrama a noite escura,
Outra sombra derrama a tua alma.
E esta sombra sou eu que, noite e dia,
Deante de ti, bem longe, vae andando...


«Meu corpo é teu espirito e harmonia.


«Sou Aquela que é amada e que não ama,
Porque o Amôr odeia o que é eterno,
E apenas se alimenta a sua chamma
Do que é mudança, dôr, fragilidade!


«Sou Aquela que é amada e que não ama!»


E Marános ouvira o marulhar
Da voz que lhe falava, como quem

Ouve, de noite, ao longe, a voz do mar...