olhasse para a cara do Sr. José Manuel assinava-lhe logo um lugar distinto na família dos velhacos de quilate. E quem tal fizesse não se enganava de modo algum; o homem era o que parecia ser. Se tinha alguma virtude, era a de não enganar pela cara. Entre todas as suas qualidades possuía uma que infelizmente caracterizava naquele tempo, e talvez que ainda hoje, positiva e claramente o fluminense, era a maledicência. José Manuel era uma crônica viva, porém crônica escandalosa, não só de todos os seus conhecidos e amigos, e das famílias destes, mas ainda dos conhecidos e amigos dos seus amigos e conhecidos e de suas famílias.
Debaixo do mais fútil pretexto tomava a palavra, e enfiava um discurso de duas horas sobre a vida de fulano ou de beltrano.
Por exemplo, conversando-se sobre qualquer objeto acontecia falar-se em D. Francisca Brites.
— Conheci muito D. Francisca Brites, atalhava imediatamente o incansável falador; era mulher de João Brites, filho bastardo do capitão Sanches; em tempo de casada diziam suas coisas dela, e a culpa tinha Pedro d’Aguiar, sujeito que não gozava de boa nota, principalmente depois que se meteu aí n’alhada de um testamento falso que atribuíram ao Lourenço da Cunha que, em abono da verdade, era bem capaz disso, pois era sujeito de mãos limpas. Foi até ele quem furtou de casa a filha de D. Úrsula, que foi moça de Francisco Borges, a quem deixou para seguir a Pedro Antunes, que por sinal lhe deu bem má vida. E também ela não devia esperar outra coisa dele, porque homem que se atreveu a fazer o que ele fez a três filhas que tinha, é capaz de tudo.