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O POÇO E O PENDULO
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do poço, agarraram-se todos ás taboas, escalaram nas e saltaram aos centos em cima de mim.

O movimento regular do pendulo não os perturbava absolutamente nada. Evitavam-lhe a passagem e trabalhavam activamente sobre a ligadura engordurada. Apertavam-se, formigavam, empilhavam-se em cima de mim. Enroscavam-se-me na garganta; os seus labios frios procuravam os meus; suffocava-me o seu peso multiplicado. Uma repugnancia, que não tem nome, revolvia-me o estomago em nauseas intoleraveis! Mas com uma resolução sobrehumana, deixei-me ficar immovel. Conhecia que a ligadura devia já estar cortada em mais de um ponto; senti-a positivamente alargar. Ainda um momento e a horrivel operação estava terminada! Não me tinha enganado nos meus calculos, não soffrera em vão! Emfim, senti que estava livre; a faixa cahiu em farrapos á roda do meu corpo. Era tempo! o movimento do pendulo atacava-me já o peito. A sarja da tunica estava rota; a camisa cortada... Fez ainda duas oscillações, e a sensação de uma dôr aguda arripiou-me o corpo todo. Felizmente, o instante da salvação estava chegado! Fiz um gesto, e os meus libertadores fugiram tumultuosamente. Então, com um movimento tranquillo, prudente e obliquo, lentamente, encolhendo-me todo, escorreguei para fóra da ligadura e para longe dos golpes da cimitarra. Estava livre!

Livre! e nas garras da inquisição! Mal tinha sahido do meu leito de horror, dera apenas alguns passos no solo da prisão, quando a machina infernal parou e tornou a subir ao tecto, attrahida por uma força invisivel. Aquella manobra foi uma lição terrivel para mim. Indubitavelmente todos os meus movimentos eram espionados.

Livre! Escapo á morte sob uma fórma de agonia; mas