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Página:O Conde Lopo.pdf/75

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2

Inteira a vida hei-de sagrar-te, ó bella,
Cantos de religião só tu me inspiras !
Que importam cores de arrebóes sem nuvens ?
Se eu vivo apenas quando tu deliras
E hei-de rir e beber cantando á noite.
Quero essa vida perpassal-a em flores!
Quero o alaúde perfumado em rozas.

3

Qu'importa áquelle que exhalou nas noites
De blasphemia febril o ardor dos lábios
Vaporoso sonhar, versos insipidos,
De sonhos juvenis mornos resabios?
E quando a morte me estender gelado,
O somno irei dormir da noite immensa,
E se sonhar — hão de sorrir-me idéas
          De gozo á treva densa.

4

E lá me estendam no torrão do campo
— Mas sem soluços, nem pranteadas dores
Co'as frescas rozas do festim na fronte
Ainda turva ao saibo dos licores!
Na lagea negra que pezar-me ao corpo
Nenhuma lettra cravem, ignorada
No seu leito de pedra — minha vida
          Durma o somno do nada.