Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/175

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Nos primeiros dias, apenas ele se fora embora, toda a casa lhe pareceu desabitada e lúgubre! Quando vira no quarto dele os cabides sem a sua roupa, a cômoda sem os seus livros, rompeu a chorar. Foi beijar a travesseirinha onde ele dormia, apertou ao peito com delírio a última toalha a que ele limpara as mãos! Tinha constantemente o seu rosto presente, ele entrara sempre nos seus sonhos. E com a separação o seu amor ardia mais forte e mais alto, como uma fogueira que se isola.

Uma tarde, que fora visitar uma prima enfermeira no hospital, viu ao chegar à Ponte gente parada, embasbacada com gozo para uma rapariga de cuia à banda e garibaldi escarlate, que, de punho no ar, já rouca, praguejava contra um soldado: o rapazola, um beirão de cara redonda e lorpa coberta de penugem loura, virava-lhe as costas, encolhendo os ombros, as mãos muito enterradas nos bolsos, rosnando:

— Não lhe fez mal, não lhe fez mal...

O Sr. Vasques, com loja de panos na Arcada, parara a olhar, descontente daquela "falta de ordem pública".

— Algum barulho? perguntou-lhe Amélia.

— O1á, menina Amélia! Não, uma brincadeira do soldado. Atirou- lhe um rato morto à cara, e a mulher está a fazer aquele espalhafato. Bêbedas!

Mas a rapariga de garibaldi vermelho voltara-se - e Amélia aterrada reconheceu a Joaninha Gomes, sua amiga da mestra, que fora amante do padre Abílio! O padre fora suspenso, deixara-a; ela partira para Pombal, depois para o Porto; de miséria em miséria voltara a Leiria, e aí vivia