Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/18

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falou com amargura, citando o Gólgota, no favoritismo da corte e na reação clerical. Alguns padres tinham-se escandalizado com o artigo; conversou-se sobre isso, acremente, diante do senhor chantre.

— Não, não, lá que há favor, há; e que o homem tem padrinhos, tem — disse o chantre. — A mim quem me escreveu para a confirmação foi o Brito Correia (Brito Correia era então ministro da Justiça).

Até me diz na carta que o pároco é um belo rapagão. De sorte que — acrescentou sorrindo com satisfação — depois de Frei Hércules vamos talvez ter Frei Apolo.

Em Leiria havia só uma pessoa que conhecia o pároco novo: era o cônego Dias, que fora nos primeiros anos do seminário seu mestre de Moral. No seu tempo, dizia o cônego, o pároco era um rapaz franzino, acanhado, cheio de espinhas carnais...

— Parece que o estou a ver com a batina muito coçada e cara de quem tem lombrigas!... De resto bom rapaz! E espertote...

O cônego Dias era muito conhecido em Leiria. Ultimamente engordara, o ventre saliente enchia-lhe a batina e a sua cabecinha grisalha, as olheiras papudas, o beiço espesso faziam lembrar velhas anedotas de frades lascivos e glutões.

O tio Patrício, o Antigo, negociante da Praça, muito liberal e que quando passava pelos padres rosnava como um velho cão de fila, dizia às vezes ao vê-lo atravessar a Praça, pesado, ruminando a digestão, encostado ao guarda-chuva:

— Que maroto! Parece mesmo D. João VI!

O cônego vivia só com uma irmã velha, a Sra.