Senhora da Boa Viagem que a livrasse de maus encontros; e se via um pobre dava-lhe invariavelmente esmola, para lisonjear os gostos de Nosso Senhor, amigo dos mendigos e vagabundos. O que a assustava era o Largo da Sé, sobre o qual a Amparo da botica, costurando por trás da janela, exercia uma vigilância incessante. Fazia-se então pequenina no seu mantelete, e abaixando o guarda-sol sobre o rosto, entrava enfim na Sé, sempre com o pé direito.
Mas a mudez da igreja, deserta e adormecida numa luz fosca, amedrontava-a; parecia-lhe sentir, na taciturnidade dos santos e das cruzes, uma repreensão ao seu pecado; imaginava que os olhos de vidro das imagens, as pupilas pintadas dos painéis se fixavam nela, com uma insistência cruel, e percebiam o arfar que ao seu seio dava a esperança do prazer. Às vezes mesmo, atravessada duma superstição, para dissipar o descontentamento dos santos, prometia dar-se nessa manhã toda à Totó, ocupar-se caridosamente só dela, e não se deixar tocar sequer no vestido pelo Sr. padre Amaro. Mas se ao entrar na casa do sineiro o não encontrava, ia logo, sem se deter ao pé da cama da Totó, postar-se à janela da cozinha, vigiando a porta maciça da sacristia, de que ela conhecia uma por uma as chapas negras de ferro.
Ele aparecia, enfim. Era então nos começos de março; já tinham chegado as andorinhas; ouviam-nas chilrear, naquele silêncio melancólico, esvoaçando entre os contrafortes da Sé. Aqui e além, plantas dos lugares úmidos cobriam os cantos de uma verdura escura. Amaro, às vezes muito galante, ia procurar uma florzinha. Amélia