Página:O Crime do Padre Amaro.djvu/450

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Com efeito as amigas da mãe estranhavam-na. Às vezes, durante serões inteiros não descerrava os lábios, pendia sobre a sua costura, picando molemente a agulha; ou então, muito cansada mesmo para trabalhar, ficava junto da mesa fazendo girar devagar o abajur verde do candeeiro, com o olhar vazio e a alma muito longe.

— Ó rapariga, deixa esse abajur em paz! diziam-lhe as senhoras nervosas.

Ela sorria, dava um suspiro fatigado, e retomava muito lentamente a saia branca que havia semanas andava bainhando. A mãe, vendo-a sempre tão pálida, pensara em chamar o doutor Gouveia.

— Não é nada, minha mãe, é nervoso, passa...

O que provava a todos que era nervoso eram os sustos súbitos que a tomavam - a ponto de dar um grito, quase desmaiar, se de repente uma porta batia. Certas noites mesmo, exigia que a mãe viesse dormir ao pé dela, com medo de pesadelos e de visões.

— É o que diz sempre o Sr. doutor Gouveia, observava a mãe ao cônego, é uma rapariga que necessita casar...

O cônego pigarreava grosso.

— Não lhe falta nada, resmungava. Tem tudo o que precisa. Tem de mais, ao que parece...

Era com efeito a idéia do cônego, que a rapariga (como ele dizia só consigo) "andava-se a arrasar de felicidade". Nos dias em que sabia que ela fora ver a Totó, não se fartava de a estudar, cocando-a do fundo da poltrona com um olho pesado e lúbrico. Prodigalizava-lhe agora as familiaridades paternais. Nunca a encontrava na