O Morgado era também grande amador de alfarrábios, questionador incansável; às vezes os dois tinham pelejas tremendas sobre história, botânica, sistemas de caça... Quando o abade, no fogo da controvérsia, punha de alto alguma opinião contrária:
— O senhor apresenta-me isso como padre ou como cavalheiro? exclamava, empinando-se, o Morgado.
— Como cavalheiro, Sr. Morgado.
— Então aceito a objeção. É sensata. Mas se fosse como padre, quebrava-lhe os ossos.
Às vezes pensando irritar o abade, mostrava-lhe João Eduardo, batendo de alto no ombro do rapaz, numa carícia de amador, como a um cavalo favorito:
— Veja-me isto! Já ia dando cabo de mim. E ainda há-de matar dois ou três... E se o prenderem eu hei-de livrá-lo da forca!
— Isso não é difícil, Sr. Morgado, dizia o abade tomando tranquilamente a sua pitada. Que já não há forca em Portugal...
Então era uma indignação do Morgado. Não havia forcas? E por que não? Porque tínhamos um governo livre e um rei constitucional! Que se se seguisse a vontade dos padres, havia uma forca em cada praça e uma fogueira em cada esquina!
— Diga-me uma coisa, Sr. Ferrão, o senhor vem defender aqui em minha casa a Inquisição?
— Oh, Sr. Morgado, eu nem sequer falei da Inquisição...
— Não falou por medo! Porque sabe perfeitamente que lhe enterrava uma faca no estômago!
E tudo isto aos gritos e aos pulos pela sala,