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O domínio público no direito autoral brasileiro
– Uma Obra em Domínio Público –

Apesar de ligeiro em sua análise, Pugliatti é categórico ao afastar o direito autoral do direito de propriedade: “no grupo de situações subjetivas que se designam de modo complexo como ‘direitos de autor’, pode-se falar de propriedade em certos aspectos: o autor de um romance é proprietário das cópias enviadas pelo editor. Mas nesse sentido, é proprietário quem adquiriu uma cópia na livraria; e o direito (pessoal) do autor, direito sobre o bem imaterial, isto é, sobre a obra de arte como criação ideal, não tem nada a ver com o direito de propriedade”[1].

Carlos Alberto Bittar qualifica os direitos autorais patrimoniais como objeto de monopólio[2]. Solução semelhante à apontada por Denis Borges Barbosa na qualificação dos direitos de propriedade intelectual, que “ao tornar exclusiva uma oportunidade de explorar a atividade empresarial, se aproximam do monopólio”[3], doutrina que guarda muita semelhança com aquela que consideramos a mais adequada e sobre a qual passamos a discorrer.

Alexandre Dias Pereira afirma, com toda a razão, que “[a] natureza jurídica do direito de autor é um problema clássico” [4]. A positivação do direito autoral é claramente fundada no direito de propriedade. Tanto assim que Le Chapelier afirmava, em 1791, ser o direito autoral “a mais sagrada, a mais legítima, a mais inatacável e (...) a mais pessoal de todas as propriedades”, antecipando as palavras do escritor português Almeida Garrett, que qualificaria o mesmo direito como “a mais indefesa, porém (...) a mais nobre, e a mais inquestionável de todas as propriedades, a que se cria pela inteligência, e pelo espírito imortal do homem”[5][6].

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  1. Tradução livre do autor. No original, lê-se que: “in quel gruppo di situazioni soggettive che si designa complessivamente come ‘diritto di autore’, si può parlare di proprietà per certi aspetti: l’autore di un romanzo è proprietario delle copie inviategli dall’editore. Ma in tale senso, è proprietario chi ne ha acquistato una copia in libreria; e il diritto (personale) di autore, diritto su bene immateriale, cioè sull’opera d’arte come creazione ideale, non ha nulla da vedere con codesto diritto di proprietà”. PUGLIATTI, Salvatore. La Proprietà e le Proprietà. Cit.; pp. 251-252.
  2. BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Autor. Cit.; p. 49.
  3. BARBOSA, Denis Borges. Uma Introdução à Propriedade Intelectual. Cit.; p. 25.
  4. PEREIRA, Alexandre Dias. Informática, Direito de Autor e Propriedade Tecnodigital. Cit. ; p. 113.
  5. PEREIRA, Alexandre Dias. Informática, Direito de Autor e Propriedade Tecnodigital. Cit.; p. 113. Assim como fazem Gama Cerqueira e Antônio Chaves em suas respectivas obras anteriormente citadas, Alexandre Dias Pereira aponta diversas teorias que ao longo dos anos se celebrizaram tentando justificar o direito de autor. Por mais tentador que seja, não incorreremos em um debate aprofundado do tema, pois que isso apenas se justificaria se fosse a definição da natureza jurídica do direito autoral o objetivo final deste trabalho. De fato, a questão é rica, mas aparentemente inesgotável. O esforço de pôr fim à disputa seria certamente infrutífero.
  6. Como lembra José de Oliveira Ascensão, eram exatamente os pensadores – escritores – os homens da Revolução Francesa. Por isso, rapidamente construíram uma ideia que os salvaguardasse. O direito a que fariam jus não seria um privilégio, mas uma propriedade – e a mais sagrada das propriedades. Era a justificação ideológica, no mau sentido da palavra, do direito de autor por via da propriedade, porém teria todos os ingredientes para triunfar. Surge assim a propriedade literária, depois prolongada como Propriedade Literária, Artística e Científica. E a arma da propriedade continua a ser usada hoje com a mesma função. ASCENSÃO, José de Oliveira. En Torno al Dominio Público de Pago y la Actividad de Control de la Administración en la Experiencia Portuguesa. La Duración de la Propriedad Intelectual y las Obras en Domínio Público. Coord,: Carlos Rogel Vide. Madri: Réus, 2005; p. 270.