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O SACI
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— Sei tanta coisa que o dificil é começar, respondeu o saci.

— Todas as coisas começam pelo principio, disse Pedrinho. Se você começar pelo principio, não terá dificuldade nenhuma em começar.

— Isso é facil de dizer, replicou o saci, mas na realidade não ha começo nem fim de coisa nenhuma. Que é que você chama começo?

— Sabe do que mais, senhor saci? O senhor já está me aborrecendo com essa filosofia. Se continua assim, enfio-o na garrafa outra vez e nunca mais o solto. Conte o que sabe e não amole.

O saci estava de veia naquela noite, preferindo discutir a contar historias. Mas a ameaça de Pedrinho o fez mudar de tom. Deu um suspiro e começou.

— Ha uma coisa na floresta que os homens nem por sombras conhecem. E´ a significação das coisas. Tudo aqui tem sua significação, e tudo é dirigido pelos duendes noturnos. Você, por exemplo, sabe que uma certa flor tem certo perfume e certa forma, mas não sabe por que motivo ela tem esse perfume e essa forma. Tambem não sabe por que umas plantas são venenosas e outras não, nem sabe por que as minhocas vivem dentro da terra em vez de viverem no galho das arvores, como as flores.

— Isso são modos de ser de cada criatura, disse Pedrinho. E´ da natureza de cada uma.

O saci sorriu.

— Que ingenuidade e que presunção! Você criticou-me, mas está fazendo tambem um jogo de palavras. Ah, se fosse contar tudo quanto sei...