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Página:O abolicionismo (1883).djvu/171

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onde a terra lhes oferece mais ampla colheita da pouca mandioca que plantam, desaparece de todo, pouco tempo depois da sua lisonjeira fundação. O regatão, formidável cancro que corrói as artérias naturais do comércio lícito das povoações centrais, desviando delas a concorrência dos incautos consumidores, não contente com os fabulosos lucros que assim aufere, transpõe audaz enormes distâncias, e lá penetra também na choça do índio. Então, a aldeia se converte para logo num bando de servidores, que distribui a seu talante, mais pelo rigor do que pela brandura, nos diversos serviços que empreende na colheita dos produtos naturais. Pelo abandono da aldeia se perde a roça, a choça desaparece e o mísero índio em recompensa de tantos sacrifícios e trabalhos recebe muitas vezes uma calça e uma camisa.

Esses regatões, de quem disse o bispo do Pará[1] que “embriagam os chefes das casas para mais facilmente desonrar-lhes as famílias”, que “não há imoralidade que não pratiquem”, não são mais do que o produto da escravidão, estabelecida nas capitais, atuando sobre o espírito cúpido e aventureiro de homens sem educação moral.

Como a aparência de riqueza que a extração da borracha dá ao vale do Amazonas, foi a do açúcar e do café cultivado pelos processos e com o espírito da escravidão. O progresso e crescimento da capital contrastam com a decadência do interior. É o mesmo em toda a parte. Com a escravidão não há

  1. Comissão do Madeira, p. 132.