Página:O bobo (1910).djvu/156

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adorar-te ainda como a um anjo de luz! Se neste mundo há para Egas futuro e para ti inocência, salva-me de mim mesmo.

Então Dulce apertando com um movimento convulso a mão do cavaleiro a encostou entre as suas ao peito, como se esperasse que no pular do coração ele pudesse conhecer que saía de lá pura e sincera a narração que lhe ia fazer.

Esta narração era a história do amor de Garcia Bermudes, amor a que ela respondera sempre com a dissimulação como o leitor já sabe. Dulce nem disfarçou a espécie de afeição inocente que consagrava ao aragonês, e que dera origem às suspeitas que tão de leve o ciúme de Egas acreditara, nem os desejos do conde e da infanta de a verem unida àquele nobre e esforçado cavaleiro. Não lhe esqueceram os acontecimentos do último sarau, e a repulsa positiva que se vira finalmente constrangida a dar. Conhecendo o carácter altivo e ao mesmo tempo generoso de Garcia, entendera dever-lhe explicar a causa daquela repulsa, e fiar dele os segredos mais íntimos do seu coração, dando-lhe assim uma prova de estima em lugar de amor. "Era esta derradeira consolação - concluía Dulce - que eu acabava de dar àquele desventurado, quando