Página:O bobo (1910).djvu/253

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Quando Egas entrou na sala do conselho, onde já o alferes-mor se achava, o conde se confirmara até certo ponto nas suas suspeitas: lera no gesto de um e de outro que eram de feito rivais. A ideia de prender a si o esforçado aragonês, fazendo-lhe obter a mão de Dulce, já não era o principal motivo que obrigava Fernando Peres a ocupar-se de alheios amores no meio dos sérios cuidados que o cercavam. Havia nisso mais graves razões. Cumpria-lhe vencer a resistência de uma herdeira ilustre, e fazer calar a repugnância da rainha diante da sua forte vontade. Naquela época um dos privilégios mais importantes, introduzido na Espanha pela influência feudal dos costumes francos, tendentes a aumentar o poderio dos príncipes e barões, era o direito de escolher marido para as órfãs nobres, filhas de feudatários dos seus estados ou senhorios. Este direito, conhecido na França pelo nome de maritágio, estabelecido depois entre nós debaixo da denominação de cartas de casamento, vigorou, estendendo-se às mesmas órfãs plebeias, pelo menos até ao século XIII, posto que fortemente combatido pelas cortes ou parlamentos. Fernando Peres considerava-se já como senhor dos condados de Portugal e Coimbra, e por isso devia impedir aquele