As duas saíram para falar à vontade; mas, nessa ocasião, lá fora no pátio da estalagem, acabava de armar-se um escândalo medonho. Era o caso que o Henriquinho da casa do Miranda ficava às vezes à janela do sobrado, nas horas de preguiça, entre o almoço e o jantar, entretido a ver a Leocádia lavar, seguindo-lhe os movimentos uniformes do grosso quadril e o tremular das redondas tetas à larga dentro do cabeção de chita. E, quando a pilhava sozinha, fazia-lhe sinais brejeiros, piscava-lhe o olho, batendo com a mão direita aberta sobre a mão esquerda fechada. Ela respondia, indicando com o polegar o interior do sobrado, como se dissesse que fosse procurar a mulher do dono da casa.
Naquele dia, porém, o estudante apareceu à janela, trazendo nos braços um coelhinho todo branco, que ele na véspera arrematara num leilão de festa. Leocádia cobiçou o bichinho e, correndo para o depósito de garrafas vazias, que ficava por debaixo do sobrado, pediu com muito empenho ao Henrique que lho desse. Este, sempre com seu sistema de conversar por mímica, declarou com um gesto qual era a condição da dádiva.
Ela meneou a cabeça afirmativamente, e ele fez-lhe sinal de que o esperasse por detrás do cortiço, no capinzal dos fundos.
A família do Miranda havia saído. Henrique, mesmo com a roupa de andar em casa e sem chapéu, desceu à rua, ganhou um terreno que existia à esquerda do sobrado e, com o seu coelho debaixo do braço, atirou-se para o capinzal. Leocádia esperava por ele debaixo das mangueiras.