e dizendo, sempre que os caixeiros ou os fregueses da taverna, só para mexer com ela, lhe davam atracações: "Óia, que eu me queixo ao juiz de orfe!", e finalmente o tal Valentim, filho de uma escrava que foi de Dona Estela e a quem esta havia alforriado.
A mulher do Miranda tinha por este moleque uma afeição sem limites: dava-lhe toda a liberdade, dinheiro, presentes, levava-o consigo a passeio, trazia-o bem vestido e muita vez chegou a fazer ciúmes à filha, de tão solicita que se mostrava com ele. Pois se a caprichosa senhora ralhava com Zulmira por causa do negrinho! Pois, se quando se queixavam os dois, um contra o outro, ela nunca dava razão à filha! Pois se o que havia de melhor na casa era para o Valentim! Pois, se quando foi este atacado de bexigas e o Miranda, apesar das súplicas e dos protestos da esposa, mandou-o para um hospital, Dona Estela chorava todos os dias e durante a ausência dele não tocou piano, nem cantou, nem mostrou os dentes a ninguém? E o pobre Miranda, se não queria sofrer impertinências da mulher e ouvir sensaborias defronte dos criados, tinha de dar ao moleque toda a consideração e fazer-lhe humildemente todas as vontades.
Havia ainda, sob as telhas do negociante, um outro hóspede além do Henrique, o velho Botelho. Este, porém, na qualidade de parasita.
Era um pobre-diabo caminhando para os setenta anos, antipático, cabelo branco, curto e duro, como escova, barba e bigode do mesmo teor; muito macilento, com uns óculos redondos que lhe aumentavam o tamanho da pupila