Nem vida, que de si tanto presuma,
Que se não veja nada, em se vendo.
Que o mais certo que temos,
He não termos nada certo
Cá na terra.
Pois para seus não nascemos;
Se o seu nos dá incerto,
Nada erra.
Quero-vos dar conta de hum Soneto sem pernas, que se fez a hum certo recontro que se teve com este destruidor de bons propositos, e não se acabou, porque se teve por mal empregada a obra; cujo teor he o seguinte:
Forçou-me amor hum dia, que jogasse;
Deo as cartas, e az de ouros levantou;
E sem respeitar mão, logo triumphou,
Cuidando que o metal, que me enganasse.
Dizendo, pois triumphou, que triumphasse
A huma sota de ouros, que jogou,
Eu então por burlar quem me burlou,
Tres paos joguei, e disse que ganhasse.
Principes de condição, ainda que o sejão de sangue, são mais enfadonhos que a pobreza: fazem com sua fidalguia, com que lhe cavemos fidalguias de seus avós, onde não ha trigo tão joeirado, que não tenha alguma hervilhaca. Ja sabeis que basta hum Frade ruim, para dar que fallar a hum convento. Duas cousas não se soffrem sem discordia; companhia no amar, mandar villão ruim sôbre cousa de seu interesse. Não se póde ter paciencia com quem quer que lhe fação o que não faz. Desagradecimentos de boas obras destruem a vontade para não fazê-las a amigo,
</poem>