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Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/114

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SONETOS.
LXXVIII.

Leda serenidade deleitosa,
Que representa em terra hum paraiso;
Entre rubis e perlas doce riso,
Debaixo de ouro e neve côr de rosa;

Presença moderada e graciosa,
Onde ensinando estão despejo e siso
Que se póde por arte e por aviso,
Como por natureza, ser formosa;

Falla de que ou ja vida, ou morte pende.
Rara e suave, em fim, Senhora, vossa,
Repouso na alegria comedido;

Estas as armas são com que me rende
E me captiva Amor; mas não que possa
Despojar-me da gloria de rendido.



LXXIX.

Bem sei, Amor, que he certo o que receio;
Mas tu, porque com isso mais te apuras,
De manhoso mo negas, e mo juras
Nesse teu arco de ouro; e eu te creio.

A mão tenho metida no meu seio,
E não vejo os meus damnos ás escuras:
Porém porfias tanto e me asseguras,
Que me digo que minto, e que me enleio.

Nem somente consinto neste engano,
Mas inda to agradeço, e a mi me nego
Tudo o que vejo e sinto de meu dano.

Oh poderoso mal a que me entrego!
Que no meio do justo desengano
Me possa inda cegar hum moço cego?