passado.{138}
CCLXXIV.
Indo o triste pastor todo embebido
Na sombra de seu doce pensamento,
Taes queixas espalhava ao leve vento,
Co'hum brando suspirar d'alma sahido:
A quem me queixarei, cego, perdido,
Pois nas pedras não acho sentimento?
Com quem fallo? A quem digo meu tormento?
Que onde mais chamo, sou menos ouvido.
Ó bella Nympha, porque não respondes?
Porque o olhar-me tanto m'encareces?
Porque queres que sempre me querelle?
Eu quanto mais te busco, mais te escondes!
Quanto mais mal me vês, mais te endureces!
Assim que co'o mal cresce a causa delle.
CCLXXV.
Dizei, Senhora, da belleza idêa,
Para fazerdes esse aureo crino,
Onde fostes buscar esse ouro fino?
De qu'escondida mina ou de que vêa?
Dos vossos olhos essa luz Phebêa,
Esse respeito, de hum Imperio dino?
Se o alcançastes com saber divino,
Se com encantamentos de Medéa?
De qu'escondidas conchas escolhestes
As perlas preciosas Orientais,
Que fallando mostrais no doce riso?
Pois vos formastes tal, como quizestes,
Vigiai-vos de vós, não vos vejais,
Fugi das fontes; lembre-vos Narciso.{139}
Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/212
Aspeto