Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/235

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triste canto:{161}
O Tejo com som grave
Corria mais medonho que suave.
  Como toda a tristeza
No silencio consiste,
Parecia que o valle estava mudo.
E com esta graveza
Estava tudo triste,
Porém o triste Almeno mais que tudo:
Tomando por escudo
De sua doce pena,
Para poder soffrella,
Estar imaginando a causa della;
Qu'em tanto mal he cura bem pequena.
Maior o he o tormento,
Que toma por allívio hum pensamento.
  Ao rio se queixava
Com lagrimas em fio,
Com que as ondas crescião outro tanto.
Seu doce canto dava
Tristes águas ao rio,
E o rio triste som ao doce canto.
Ao sonoroso pranto,
Que as águas enfreava,
Responde o valle umbroso.
De tanta voz o accento temeroso
Na outra parte do rio retumbava;
Quando, da phantasia
O silencio rompendo, assi dizia:
  Corre suave e brando
Com tuas claras ágoas,
Sahidas de meus olhos, doce Tejo;{162}