Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/26

Wikisource, a biblioteca livre
XXII
PREFAÇÃO.

Vós, Nereidas do sal em que navego,
Por quem do vento a furia pouco temo;
Se a vossas sacras aras nunca nego
O congro nadador na pá do remo,
Não consintais que a musica marinha
Vencida seja aqui na lyra minha.

Que terão que dizer esses Senhores a estas duas Estancias? Dirão que são demasiado sublimes, e que estão fóra do natural, porque a este simples, a este natural, a este sublime não podem elles chegar. Mas não lhes demos ouvidos, e continuemos a prestar attenção aos nossos contendores. Vejamos com que despejo entrão na lide.

Agrario.


  Pastor se fez um tempo o moço louro
Que do pae as carretas move e guia;
Ouvio o rio Amphryso a lyra d'ouro,
Que o seu claro inventor alli tangia.
Io foi vacca, Jupiter foi touro
Mansas ovelhas junto d'ágoa fria
Guardou formoso Adonis, e tornado
Em bezerro Neptuno foi ja achado.

A esta formosa Estancia em louvor da vida campestre oppõe o pescador a seguinte, exaltando a sua profissão.

Alicuto.


  Pescador ja foi Glauco, e deos agora
He do mar, e Protêo phocas guarda;