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Ser verdade mais pura
Do que d'Arabia o ouro reluzente;
Inda que não quizesseis,
Essa condição dura
Em branda se mudára facilmente.
Eu, vendo-me innocente,
Senhora neste caso,
Bem no arbitrio o puzera
De quem sentença dera,
Com que o que he justo se mostrasse raso;
Se, emfim, não receára
Que a vós por mi, e a mi por vós matára.
Em vós escrita vi
Vossa grande dureza,
E n'alma escrita está, que de vós vive:
Não que acabasse alli
Sua grande firmeza
O triste desengano qu'então tive;
Porque antes que me prive
A dor de meus sentidos,
Ao penoso tormento
Acode o entendimento
Com dous fortes soldados guarnecidos
De rica pedraria,
Que ficão sendo minha luz e guia.
Destes acompanhado
Estou pôsto sem medo
A tudo o que o fatal destino ordene:
Póde ser que cansado,
Ou seja tarde, ou cedo,
Com pena de penar-me, me despene.{328}
Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/401
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