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Página:Obras de Manoel Antonio Alvares de Azevedo v2.djvu/90

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Ainda! e o tempo corre! e nada escripto!

(Lê.)

Harold! Harold!... 6 Christo! Harold!... o duque Guilher¬ me... E que me importa esse Harold, eu vo-lo pergunto? Nem posso entender como escrevi isto !

(Rompe o manuscripto ao fallar. — Descahe no delírio.)

Fingi-me catholico : menti. Se eu fosse catholico, eu me fizera monge e cartuxo. Um cartuxo tem por leito um ataúde, mas ahi ao menos dorme. Todos os homens tem um leito onde durmão — eu tenho um onde trabalho por dinheiro.

(Leva a mão á cabeça.)

Onde vou? onde vou? A palavra leva de rojo a idéa á força... Ó céo! a loucura não lavra assim ? Eis com que assustar os mais valentes... Eia! calma-te...— Eu relia isto... sim... Este poema não é bello de certo... Escripto muito a correr... escripto para viver!... oh! supplicio! A batalha de Hastings! os velhos Saxões!... os jovens Normandos!... Interessei-me eu nisso? não. Porque pois fallei-o? Quando tanto havia a dizer sobre o que vejo !

(Ergue-se e passêa a passos largos.)

Ir acordar cinzas frias, quando tudo treme e soffre ao pé de mim! quando a Virtude chama a si em soccorro, e esperéce ás lagrimas; quando o pallido trabalho paga-se a desdem : quando a Esperança perdeu sua ancora, a Fé seu calix, a Caridade seus pobres filhos; quando a lei é athéa e corrupta como a manceba; quando a terra grita e pede justiça ao poeta contra aquelles que a escavão por ouro, e dizem-lhe que ella póde viver sem o céo!

E eu! eu que o sinto, não responderei? Sim, pelo céo? responderei! Zurzirei com o latego os máos e os hypocritas! Rasgarei o véo a Jeremiah, Miles e Warton.