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ORIGEM DAS ESPÉCIES

que de quando em quando se descobrem animais mesmo vivos que, como a lepidossereia, se ligam, pelas suas afinidades, a grupos muito distintos. Todavia, se compararmos os mais antigos répteis e os mais antigos batráquios, os mais antigos peixes, os mais antigos cefalópodes e os mamíferos da época eocénia, com os membros mais recentes das mesmas classes, necessário nos é reconhecer que esta observação é verdadeira.

Vejamos até que ponto os diversos factos e as deduções que precedem concordam com a teoria da descendência com modificação. Peço ao leitor, vista a complicação do assunto, para recorrer ao quadro de que nos temos já servido no capítulo quarto. Suponhamos que as letras em itálico e numeradas representam géneros, e as linhas pontuadas, que se afastam divergindo, as espécies de cada género. A figura é muito simples e dá-nos somente um pequeno número, géneros e espécies; mas pouco importa. As linhas horizontais podem figurar formações geológicas sucessivas, e podem considerar-se como extintas todas as formas colocadas abaixo da linha superior. Os três géneros existentes a14, q14, p14, formarão uma pequena família; b14 e f14, uma família muito próxima ou subfamília, e o14, e14, m14, uma terceira família. Estas três famílias reunidas aos numerosos géneros extintos fazendo parte das diversas linhas de descendência provindo por divergência da espécie-mãe A, formarão uma ordem; porque todos terão herdado alguma coisa comum do antepassado primitivo. Em virtude do princípio da tendência contínua à divergência dos caracteres, para cuja explicação o nosso diagrama serviu já, quanto mais recente for uma forma, tanto mais deve ordinàriamente diferir do ascendente primordial. Podemos por aqui compreender fàcilmente a razão por que são os fósseis mais antigos que mais diferem das formas actuais. A divergência dos caracteres não é, todavia, uma eventualidade necessária; pois que esta divergência depende unicamente de que permitiu aos descendentes de uma espécie apoderar-se de mais lugares diferentes na economia da natureza. É pois muito possível, assim como o temos visto para algumas formas silúricas, que uma espécie possa persistir apresentando apenas leves modificações correspondentes a fracas alterações nas suas condições de existência, conservando, porém, durante um longo período, os seus traços característicos gerais. É o que representa, na figura, a letra F14.

Todas as numerosas formas extintas e vivas derivadas de A constituem, como já o fizemos notar, uma ordem que, sequentemente aos efeitos contínuos da extinção e da divergência dos caracteres, está dividida em muitas famílias e subfamílias;