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ORIGEM DAS ESPÉCIES

formações consecutivas são invariàvelmente muito mais estreitamente ligados uns aos outros do que o são os de formações separadas por maiores intervalos.

Eis, em resumo, as respostas e explicações que podem dar-se às objecções e às diversas dificuldades que tentam levantar-se contra a minha teoria, dificuldades de que eu mesmo por muito tempo senti o peso para duvidar da sua importância. Mas é necessário notar, com cuidado, que as objecções mais sérias se referem às questões a respeito das quais a nossa ignorância é tal que nem de leve lhe supomos sequer a extensão. Não conhecemos todas as gradações possíveis entre os órgãos mais simples e os mais perfeitos; não podemos pretender conhecer todos os meios diversos de distribuição que têm podido agir durante longos períodos do passado, nem a extensão da imperfeição dos documentos geológicos. Por mais sérias que sejam estas diversas objecções, não são, contudo, quanto a mim, de molde a rebater a teoria da descendência com modificações subsequentes.


Examinemos agora outro lado da questão. Observamos, no estado doméstico, que as alterações das condições de existência causam, ou pelo menos excitam, uma variabilidade considerável, mas muitas vezes de uma maneira tão obscura que somos dispostos a considerar as variações como espontâneas. A variabilidade obedece a leis complexas, tais como a correlação, o uso e não uso, e a acção definida das condições exteriores. É difícil saber até que ponto as nossas produções domésticas foram modificadas; mas podemos certamente admitir que o foram muito, e que as modificações ficam hereditárias durante longos períodos, Desde que as condições exteriores ficaram as mesmas, podemos crer que uma modificação, hereditária desde numerosas gerações, pode continuar a sé-lo ainda durante um número de gerações quase ilimitado. Demais, temos a prova de que, quando a variabilidade tem uma vez começado a manifestar-se, continua a agir durante muito tempo no estado doméstico, porque vemos ainda aparecer ocasionalmente variedades novas nas nossas produções domésticas mais antigas.

O homem não tem influência alguma imediata sobre a produção da variedade; expõe somente, sem desígnio, os seres melhor organizados a novas condições de existência; a natureza actua, pois, sobre a organização e fá-la variar. Mas o homem pode escolher as variações que a natureza lhe fornece, e acumulá-las como entenda; adapta também os animais e as plantas ao seu uso e aos seus desejos. Pode operar esta selecção metò-